Maria Rosilene de Moraes 1
Já se passaram uns
bons anos que a tão falada Princesa Isabel assinou a mais falada ainda Lei
Áurea que libertou os escravos. Quanto a isso há controversa, mas que neste
momento não será discutida.
Mesmo depois de
tanto tempo ainda se pode ver o desenrolar de brigas políticas entre os
coronéis (ainda assim podem ser chamados), rivais na política e na disputa pelo poder. Paralelamente a
esse embate, acontece a demanda entre patrões e empregados, entre brancos e
negros (mesmo de cabelo liso e pintado de loiro), entre líderes e liderados,
tudo isso num cenário caipira que sempre fez parte da história nacional, agora
com o chique nome de cenário de agronegócio.
Nas fazendas ainda
se tira leite de vaca, se colhe frutas e verduras, se planta o sustento e
arranca o verde da terra roxa para criar a família.
Aos
domingos se vê ferver o famoso frango caipira, com aquela caninha “das boas”
antes do almoço que é só pra abrir o apetite, não sabe? E foi num deste domingo
que o frango morreu cedo, que é pra ficar fervendo bem devagarinho ali, na
panela de pedra em fogão de lenha, por horas, até se desgrudar dos ossos para
engrossar o caldo. Foi assim que o fato aconteceu?
Que
fato? Ah! É mesmo! Esqueci-me de contar o fato. Agora vou contar. Começando
pelo começo.
Sem
mais rodeio, mãe e filha estão na cozinha, em meio a fumaça, que é pra não
perder o costume. As duas entretidas em depenar, picar e limpar um frango
caipira, bem limpinho. Um frango grande e gordo, pego no próprio terreiro. É
bem verdade que ele foi escolhido entre tantos frangos no terreiro por um
motivo muito especial: era preto. Toda sua plumagem era preta. A matrona não
queria um galo preto no terreiro porque poderia se multiplicar essa raça e, com
o tempo, seu terreiro teria vários exemplares dessa “cor feia”.
Entre
uma conversa e outra o assunto da cor vem à tona. A mãe, depois de depenado e
lavado, abriu o frango pelas costas, e não se conteve diante do que viu, como
se fosse a primeira vez: “Nossa, o frango é preto só por fora, por dentro ele é
igual aos outros”.
O
fato é um agravo à sociedade que se diz liberta da escravidão. A discriminação
racial, ainda é uma preocupante realidade, suportada por muitas pessoas que são
julgadas não por suas atitudes ou pela nobreza de seus ideais, mas por sua cor.
A
dignidade da pessoa humana é um dos fundamentos da República Federativa do
Brasil (art. 1º, III, da CRFB), possuindo como objetivos fundamentais a
construção de uma sociedade livre, justa, solidária, e a promoção do bem de
todos, sem preconceitos de origem, raça, cor, ou de qualquer outra espécie
(art. 3º, I e IV, da CRFB), e ainda, consagra a igualdade como direito
fundamental (art. 5º, caput, da CRFB). Está expresso na CF/88 que a prática do
racismo é crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos
termos da lei (art. 5º, XLII).
A
Lei nº 12.288/2010 (Estatuto da Igualdade Racial), por sua vez, reforça o
intenso propósito de combate à discriminação racial cometida contra a população
negra.
A "cor" da epiderme de cada pessoa é irrelevante,
já que o interior é igual para todos. Pouco
importa, em um Estado Democrático de Direito, as características da pele de
cada indivíduo, que lhe é peculiar, inerente, e, por natureza, imutável.
Num país de afrodescendentes (mesmo de cabelo liso e loiro) é
de renegar que situações de racismo no esporte, na religião, na política, na
educação, na saúde e em outros setores mais, venham acontecendo e envergonhando
o povo brasileiro. Um povo que só quer ser feliz e viver em paz pra comer um
frango caipira e beber uma caninha no domingo.
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[1]Maria
Rosilene de Moraes. Centro de Ensino Superior de São Gotardo. Faculdade de
Ciências Gerenciais. Aluna do Curso de Direito. Pós-graduanda em Gestão Escolar
pela Universidade Federal de Ouro Preto. Pós-graduanda em Educação
Empreendedora pela Universidade Federal de São João Del Rei. Graduada Em
Ciências Biológicas pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.
Graduada em Matemática pelo Instituto Superior de Educação Elvira Dayrell na
Faculdade dos Vales Elvira Dayrell. E-mail: rosil_moraes@hotmail.com
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