terça-feira, 3 de março de 2015

O REFLEXO DA ESCRAVIDÃO AINDA REINA NO SÉCULO XXI

                                                                      Maria Rosilene de Moraes 1

Já se passaram uns bons anos que a tão falada Princesa Isabel assinou a mais falada ainda Lei Áurea que libertou os escravos. Quanto a isso há controversa, mas que neste momento não será discutida.
Mesmo depois de tanto tempo ainda se pode ver o desenrolar de brigas políticas entre os coronéis (ainda assim podem ser chamados), rivais na política e na disputa pelo poder. Paralelamente a esse embate, acontece a demanda entre patrões e empregados, entre brancos e negros (mesmo de cabelo liso e pintado de loiro), entre líderes e liderados, tudo isso num cenário caipira que sempre fez parte da história nacional, agora com o chique nome de cenário de agronegócio.
Nas fazendas ainda se tira leite de vaca, se colhe frutas e verduras, se planta o sustento e arranca o verde da terra roxa para criar a família.
Aos domingos se vê ferver o famoso frango caipira, com aquela caninha “das boas” antes do almoço que é só pra abrir o apetite, não sabe? E foi num deste domingo que o frango morreu cedo, que é pra ficar fervendo bem devagarinho ali, na panela de pedra em fogão de lenha, por horas, até se desgrudar dos ossos para engrossar o caldo. Foi assim que o fato aconteceu?
Que fato? Ah! É mesmo! Esqueci-me de contar o fato. Agora vou contar. Começando pelo começo.
Sem mais rodeio, mãe e filha estão na cozinha, em meio a fumaça, que é pra não perder o costume. As duas entretidas em depenar, picar e limpar um frango caipira, bem limpinho. Um frango grande e gordo, pego no próprio terreiro. É bem verdade que ele foi escolhido entre tantos frangos no terreiro por um motivo muito especial: era preto. Toda sua plumagem era preta. A matrona não queria um galo preto no terreiro porque poderia se multiplicar essa raça e, com o tempo, seu terreiro teria vários exemplares dessa “cor feia”.
Entre uma conversa e outra o assunto da cor vem à tona. A mãe, depois de depenado e lavado, abriu o frango pelas costas, e não se conteve diante do que viu, como se fosse a primeira vez: “Nossa, o frango é preto só por fora, por dentro ele é igual aos outros”.
O fato é um agravo à sociedade que se diz liberta da escravidão. A discriminação racial, ainda é uma preocupante realidade, suportada por muitas pessoas que são julgadas não por suas atitudes ou pela nobreza de seus ideais, mas por sua cor.
A dignidade da pessoa humana é um dos fundamentos da República Federativa do Brasil (art. 1º, III, da CRFB), possuindo como objetivos fundamentais a construção de uma sociedade livre, justa, solidária, e a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, cor, ou de qualquer outra espécie (art. 3º, I e IV, da CRFB), e ainda, consagra a igualdade como direito fundamental (art. 5º, caput, da CRFB). Está expresso na CF/88 que a prática do racismo é crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei (art. 5º, XLII).
A Lei nº 12.288/2010 (Estatuto da Igualdade Racial), por sua vez, reforça o intenso propósito de combate à discriminação racial cometida contra a população negra.
A "cor" da epiderme de cada pessoa é irrelevante, já que o interior é igual para todos.  Pouco importa, em um Estado Democrático de Direito, as características da pele de cada indivíduo, que lhe é peculiar, inerente, e, por natureza, imutável.

Num país de afrodescendentes (mesmo de cabelo liso e loiro) é de renegar que situações de racismo no esporte, na religião, na política, na educação, na saúde e em outros setores mais, venham acontecendo e envergonhando o povo brasileiro. Um povo que só quer ser feliz e viver em paz pra comer um frango caipira e beber uma caninha no domingo.
________________________
[1]Maria Rosilene de Moraes. Centro de Ensino Superior de São Gotardo. Faculdade de Ciências Gerenciais. Aluna do Curso de Direito. Pós-graduanda em Gestão Escolar pela Universidade Federal de Ouro Preto. Pós-graduanda em Educação Empreendedora pela Universidade Federal de São João Del Rei. Graduada Em Ciências Biológicas pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Graduada em Matemática pelo Instituto Superior de Educação Elvira Dayrell na Faculdade dos Vales Elvira Dayrell. E-mail: rosil_moraes@hotmail.com

Nenhum comentário:

Postar um comentário